A Câmara dos Deputados aprovou na noite desta terça-feira um polêmico projeto de lei que autoriza a produção e distribuição da fosfoetanolamina sintética, a chamada “pílula do câncer”, que nunca foi testada em pessoas. O texto ainda será analisado pelo Senado Federal, que pode fazer alterações.
Desenvolvida pelo Instituto de Química de São Carlos, da Universidade de São Paulo (USP), a substância vem sendo alardeada como cura para diferentes tipos de tumor, mas nunca passou por testes em humanos. Ou seja, sua eficácia não é comprovada cientificamente e, por isso, não pode sequer ser considerada um medicamento. A fosfoetanolamina sintética não foi regulamentada da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).
Segundo o texto aprovado na Câmara, a fosfoetanolamina vai poder ser usada mediante apresentação de laudo médico e com consentimento do paciente, que teria que assinar um termo de compromisso. A proposta também autoriza a fabricação da substância mesmo sem o registro sanitário. Mas esta fabricação ficaria a cargo de "agentes regularmente autorizados e licenciados pela autoridade sanitária competente", afirma o texto.
"Ficam permitidas a produção e manufatura, importação, distribuição e prescrição, dispensação, posse ou uso da fosfoetanolamina sintética, direcionadas aos usos de que trata esta lei, independentemente de registro sanitário, em caráter excepcional, enquanto estiverem em curso estudos clínicos acerca dessa substância", lê-se num outro trecho do projeto de lei.
Durante anos, a "pílula do câncer" foi distribuída por funcionários da USP de São Carlos, com relatos de pacientes defendendo sua eficácia. Em junho do ano passado, a universidade parou de repassar a substância. Pacientes e familiares começaram a entrar na Justiça para obter as pílulas, e, em outubro, o Supremo Tribunal Federal (STF) destravou a distribuição. Imediatamente, pacientes e familiares formaram filas no local. No mês seguinte, porém, uma outra decisão, desta vez do Tribunal de Justiça de São Paulo, impediu o repasse.
No momento, a fosfoetanolamina sintética está sob análise do Instituto do Câncer de São Paulo, que fará testes em seres humanos, já autorizados pela Comissão Nacional de Ética em Pesquisa do Conselho Nacional de Saúde (Conep), de acordo com o site "G1".
O deputado Arlindo Chinaglia (PT-SP), um dos defensores do texto aprovado nesta terça pela Câmara, disse que a orientação médica permitirá que se controle a venda do produto:
— Vamos aumentar muito os casos controlados.
O deputado Mandetta (DEM-MS), que é médico, criticou o projeto e disse que a aprovação iria politizar a discussão sobre o câncer:
— Essa não é a maneira correta de fazer pesquisa. Politizar a cura do câncer me parece de extremo mau gosto.
Partidos de oposição, que estão obstruindo os trabalhos na Câmara esta semana, fizeram um acordo para suspender a posição apenas para votar o projeto sobre o câncer, com a promessa de que nada mais seria votado nesta terça-feira.